A RESPONSABILIDADE NA PROTEÇÃO AO MEIO AMBIENTE E O DIREITO À
SAÚDE: A EXISTÊNCIA DE REAL EFETIVIDADE DO PRINCÍPIO DA
PREVENÇÃO, DA REPARABILIDADE E DA PRESERVAÇÃO DIANTE DO
ALCANCE DAS TRÊS ESFERAS JURÍDICAS (CIVIL, ADMINISTRATIVA E
PENAL). CONDIÇÕES DE SAÚDE E HIGIÊNE DAS CIDADES E DO TRABALHO
HUMANO.
The responsibility in protecting the environment: the existence of real effectiveness of
the principle of prevention, reparability and preservation facing the reach of the three
legal spheres (civil, administrative and criminal). Health and hygiene conditions of
cities and human work.
Robinson Neves Filho
RESUMO: O objetivo desse trabalho é demonstrar a viabilidade da legislação brasileira
de proteção ao meio ambiente permitir a efetiva execução do acesso à saúde, ao meio
ambiente do trabalho hígido e compreender a presente determinação estrutural dos
instrumentos de proteção para reparar danos de qualquer natureza e de viabilizar a
prevenção da degradação ambiental à saúde da população e do ambiente do trabalho,
no qual passamos a maior parte do tempo de nossas vidas.
METODOLOGIA: A estrutura de pesquisa foi realizada através do método
hermenêutico, levantando-se trabalhos doutrinários elaborados por autores
especialistas e amplamente citados na matéria discutida e da análise de precedentes
judiciais relativos à proteção do meio ambiente.
Resultados: Ficou claro a dificuldade de aproximação da legislação brasileira de
proteção ao meio ambiente, de perfeita e profícua elaboração, da realidade dos
acessos ao direito à saúde a um hígido ambiente de trabalho, mas constatou-se uma
evolução eficaz na aplicação dos princípios da prevenção, proteção e da reparabilidade
a favor do meio ambiente.
PALAVRAS-CHAVE: Meio ambiente. Direito à saúde. Dignidade humana. Trabalho.
INTRODUÇÃO
O conteúdo da proteção do meio ambiente pelo legislador
constitucional e ordinário no Brasil é de uma extensão ímpar. Na pesquisa realizada
vislumbrou-se o alcance da legislação brasileira para assegurar a maior garantia
* 1 Aluno de mestrado em Planejamento Regional e Gestãp de Cidade pela Universidade Cândido Mendes. E-mail:
robinsonnneves2015@gmail.com. e advogado. E-mail: robinson@nevesfilhoadvocacia.adv.br.
possível do bem jurídico meio ambiente (CF, art. 225, § 3º)2
, provavelmente, um dos
bens jurídicos mais bem protegidos em nossa legislação.
O âmbito de proteção do meio ambiente, evidentemente,
considera a necessidade de previsão legislativa da responsabilidade em matéria
ambiental, mas fomos desde a pior das hipóteses, qual seja, a existência de efetivo
dano até a melhor das hipóteses, a exploração econômica sem o dano, ou seja, a
prevenção como meio de responsabilidade com o bem jurídico em questão.
Não se tem em vista apenas um aspecto repressivo ou reparativorestaurativo do dano ao meio ambiente (MAGRI, 2010), mas a responsabilidade nos
três âmbitos jurídicos civil, administrativo e penal de modo constante e efetivo para não
haver dano que se constitua ao meio ambiente quando da exploração econômica e,
quando havendo, com ou sem exploração econômica, o sistema garante a incidência
efetiva da responsabilidade de modo repressivo, restaurativo, indenizatório prevendo,
inclusive, compensação ambiental, obrigações de fazer e não fazer, dentre outros,
desde o início da pretensão do explorador.
Pois bem. Tudo isso pode gerar um ambiente hígido de saúde e
trabalho para o indivíduo? Alcança e garante a existência de o direito à saúde, do
respeito à dignidade humana3 e o direito ao trabalho ou permanecem precários, apesar
da evolução legislativa? Atingiu o esforço legislativo a melhora nas condições de saúde,
dignidade de vida humana e trabalho? O pensamento nesse trabalho seria trazer
respostas a essas indagações.
PRINCÍPIO DA PREVENÇÃO, DA REPARABILIDADE E DA PRESERVAÇÃO COMO
INSTRUMENTOS LEGISLATIVOS E GARANTIAS DO ACESSO À SAÚDE E AO
TRABALHO.
A moderna legislação brasileira procura, sem dúvida, empreender
princípios e instrumentos voltados a prevenir o dano ambiental de modo a não permitir
submissão do direito à saúde e do direito ao trabalho com meio de prejuízo para o meio
ambiente. Explorá-lo como meio de formatação do sistema de produção capitalista, não
nos enganemos, é essencial, ou seja, o capitalismo atual não se afasta da necessária
exploração econômica do meio ambiente para seu sustento.
Não se pode considerar, no entanto, a viabilidade de nessa
exploração, os atuais meios de produção capitalista gerar prejuízo ao meio ambiente,
a ponto de o acesso à saúde ser precário, o ambiente de trabalho ser fonte de doenças
e tornar a proteção constitucional à dignidade humana uma mera pluma de fantasia em
nossa legislação.
2
“As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou
jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados [ou
seja], responsabilidade civil”.
3 Art. 1º, inciso III, da Constituição Federal.
De há muito o mundo busca o acesso à saúde e ao trabalho não
menos de modo a compreender a dignidade humana como pressuposto essencial de
eficácia. Mas, efetivamente, a proteção do meio ambiente está voltada a promover o
bem maior da sociedade e de todos no planeta, mas como já definia BALERA, 1989,:74
“O bem-estar da polução depende de medidas concernentes à promoção, à proteção e
recuperação da saúde. Daí que todos, sem exclusão, deverão ter igual acesso aos
serviços de saúde. Aliás, o que importa, é o direito que todos possuem, de não ficarem
doentes.”, sendo evidente que também não pode haver a precarização do trabalho
(COUTINHO, 2009).
Não há como deixar de observar:
Neste momento da história, marcado pela extensão monstruosa
da barbárie, pela transformação da natureza em mercadoria, em
sintonia com o processo mais amplo, falar me direito à saúde e da
universalidade desse direito numa formação social capitalista
periférica, na qual se cumprem com o mais extremado zelo todas
as regras do Consenso de Washington, que impõem como
princípio político a própria “flexibilização” das normas jurídicas de
proteção dos trabalhadores, parece-me, salvo engano, “ir do
abstrato, para o abstro, sem jamais sair do abstrato”, para fazer
uma paráfrase à célebre afirmação de Marx sobre o processo de
construção do conhecimento. (COUTINHO, 2009, 174).
Mais interessante ainda é nossa legislação trazer conceito jurídico
do poluidor4 para o sistema de proteção do meio ambiente, tornando o potencial
poluidor, seja ele um fazendeiro, um industrial, um madeireiro, um minerador, um
empregador, uma empresa (pessoa jurídica) ou mero especulador, claro, dentre outros
possíveis, pessoa física ou jurídica, não importa, responsável de forma direta ou indireta
pela atividade propiciadora do dano ambiental ou como define a lei (PNMA) degradação
ambiental.
Não obstante a responsabilidade direta dos sujeitos acima
indicados, exemplificadamente, ainda são alcançáveis e tidos como poluidores os
atores indiretos, ou seja, aqueles que de forma indireta tenham contribuído para a
atividade econômica causar a degradação ambiental. São exemplos os que facilitam
ou viabilizam a ocorrência do dano ou degradação, como os bancos financiadores ou
fomentadores da atividade, órgãos públicos, os próprios licenciadores, o engenheiro, o
arquiteto, o incorporador, o corretor, o transportador, e por não deixar de dizer, o próprio
advogado prestador de serviços jurídicos para a implementação da exploração do
interesse do cliente explorador direto. Enfim, toda uma gama de serviços prestados
para a exploração econômica do meio ambiente é alcançada pela responsabilidade
jurídica nos seus âmbitos civil, administrativo e penal.
4
“art. 3º, IV, PNMA – poluidor, a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou
indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental;
Esse quadro até agora posto, de fato, sensibiliza a demonstração
do legislador em proteger o meio ambiente. Poucas são as legislações capazes de um
escopo de tamanha envergadura e com tamanha efetividade, evidentemente, se
adequadamente observada, desde a parte administrativa de prevenção, até a de
responsabilização civil e penal, normalmente ambas após já efetivado o dano. Mas,
evitá-lo ao meio ambiente é a maior compreensão que o legislador ordinário teve do
princípio da prevenção, base essencial para a efetividade da proteção ao meio
ambiente.
Fácil observar não haver necessidade alguma de provocação
externa, ou seja, haver um dano ou ameaça de dano para se cogitar de atividade dos
instrumentos de proteção. O simples fato de pretender iniciar uma exploração
econômica, do plantar soja a produzir petróleo, já há a necessidade de colher
autorizações do poder público, conceber toda a dinâmica da atividade em todo o seu
contexto inicial, final e, por lógico, o durante, para já precaver, prevenir, a possibilidade
de dano ao meio ambiente. Sem essa real “defesa”, que não é inerte, inexiste no Brasil
a possibilidade de exploração econômica do meio ambiente.
Esse aspecto ressalta aos olhos de quem passa a observar com
maior profundidade o cuidado de nosso legislador, de qualquer hierarquia, com o bem
jurídico meio ambiente e o quanto isso faz gerar certezas de colher no presente e no
futuro a manutenção da raça humana, do bem-estar da sociedade, da riqueza (melhor
distribuída) e ainda garantir uma diminuição adequada e essencial das desigualdades
sociais.
De outro modo não se pode negar a intensidade da legislação
brasileira na proteção do direito do trabalhador. Não se nega as flexibilizações e o
fenômeno da terceirização permitido na nossa legislação, mas há a evidência de ainda
não haver a amplitude do conceito do direito à saúde e a um meio ambiente hígido para
viver e trabalhar no Brasil.
Chegamos ao nível de cuidado legislativo para definir que “… ao
meio ambiente do trabalho pouco importa o vínculo contratual, pouco importa a
subordinação, pouco importa a valoração econômica do trabalho. O que importa
realmente é a proteção ao meio ambiente onde o trabalho humano é prestado. Um bem
a ser protegido para que o trabalhador possa gozar uma melhor qualidade de vida.”.
(MURAD, 2009).
Mas, persistem até hoje máculas ainda não sanadas. Insiste
expondo MURAD que:
Ali no Banco da esquina, bancários sofrem pressões absurdas
para cumprirem metas sob pena de demissão, rebaixamento de
função e perda de prerrogativas conquistadas. A funcionária do
caixa de supermercado não pode ir ao banheiro, e para tanto usa
fralda geriátrica para otimizar seu desempenho. Aquela cervejinha
que você deixou de beber ontem à noite vai fazer com que o
funcionário de uma indústria gigante do setor de bebidas deixe de
atingir sua meta, obrigando-o a ficar de pé nas reuniões de
trabalho além de ter que usar uma camiseta com a inscrição
“lento” e se sujeitar a outras situações vexatórias. Aquela cidadã
do telemarketing que nos atormenta, vive em permanente estado
de terror psicológico para atingir também, suas metas. (MURAD,
2009; 149).
Na mesma esteira, O meio ambiente do trabalho adequado e
seguro é um dos mais importantes e fundamentais direitos do cidadão trabalhador, o
qual, se desrespeitado, provoca agressão a toda a sociedade, que, no final das contas,
é quem custeia a Previdência Social. (MELO, 2010).
Há precedente judicial destacável sobre a higidez do meio
ambiente do trabalho nos dias atuais para se notar a importância da proteção desse
bem jurídico, voltado para o direito à saúde, inclusive no ambiente de trabalho, mas que
merece destaque. Vale copilar:
DANOS MORAIS. RACISMO RECREATIVO
Alega a reclamante que foi vítima de assédio moral por parte de
uma de suas supervisoras, que desferiu comentários racistas e
preconceituosos na frente de outros funcionários e até em reunião
com clientes.
Afirma que, em certa ocasião, a supervisora Thais elogiou os
cabelos lisos e loiros de uma das clientes e, fazendo referência
ao cabelo da reclamante, teria dito: “pelo menos seu cabelo é bom
e não cabelo da Etiópia”.
Além disso, alega que no dia 25/08/2020, em reunião de equipe
realizada em plataforma virtual, a supervisora Thais iniciou o
encontro com o seguinte comentário: “Estou com vontade de ver
todo mundo e em breve irei marcar uma reunião para ver o rosto
de todos. Quero ver se fulano cortou o cabelo e se a —- continua
preta…”.
A autora narra que após o comentário precisou fechar a câmera
da reunião, pois não conseguia conter as lágrimas e, a partir de
então, evitou ao máximo abrir a câmera nas reuniões realizadas,
pois se sentia constrangida e com receio de ser novamente
exposta diante dos colegas.
A reclamante afirma que, após o comentário, todos ficaram em
silêncio absoluto na reunião e, após o ocorrido, o comentário da
supervisora passou a circular nos grupos de WhatsApp da
empresa, sendo que, em sua maioria, todos corroborando que o
comentário havia sido extremamente desrespeitoso.
No dia seguinte, a autora alega que procurou a supervisora para
expor que não tinha se sentido confortável com o comentário, ao
que esta teria pedido desculpas e dito que sequer se lembrava do
fato.
Com relação ao proprietário da ré, a reclamante menciona que,
ao lhe reportar o que havia acontecido, este teria tentado
minimizar os fatos, dizendo que “a ofensora em nenhum momento
quis desrespeitar a reclamante”, “que foi um fato isolado” e que foi
“uma brincadeira fora de hora, que não foi ofensivo”.
Por fim, a reclamante afirma que após 2 meses do ocorrido foi
imotivadamente dispensada, sob a justificativa de problemas
financeiros e necessidade de restruturação da equipe,
argumentos que, para a autora, não se justificariam pois, à época,
a reclamada estava em fase de expansão e o trabalho da
reclamante sempre havia sido elogiado pelos gestores, de forma
que a postulante entende que sua dispensa estaria relacionada
ao fato de ter questionado o comentário da supervisora Thais.
Assim, diante dos fatos narrados, pretende a reclamante
indenização por danos morais.
No caso, a reclamada reconhece o comentário da supervisora
Thais, feito em reunião por videoconferência, mas defende que
não houve a intenção de ofender a reclamante e que a Sra. Thais
teria ligado para a autora depois da mensagem que recebeu dela,
se desculpando por qualquer mal entendido e explicando que o
que falou não foi em tom de ofensa.
A ré acrescenta que acreditava que a questão estava resolvida
pois a autora, inclusive, teria respondido “com um coração” a
conversa por mensagem e, em outra oportunidade, já chamava a
Sra. Thais por “Tha”, levando a crer que não havia mais nenhum
ressentimento envolvido, conforme fls. 66.
Já com relação aos comentários sobre o cabelo da cliente ser
“bom” e não ser “da Etiópia”, a ré afirma que tal conversa se deu
apenas entre a cliente e a Sra. Thais que, no caso, se referia ao
seu próprio cabelo e não ao da reclamante.
No que tange à dispensa da autora, a reclamada nega qualquer
relação com os fatos narrados na exordial, aduzindo que a
motivação foi a falta de comprometimento da reclamante e seu
desempenho insuficiente.
Analiso.
A prova do dano moral está mais relacionada à comprovação do
fato que lhe deu ensejo do que ao dano propriamente dito. Isso
porque o dano moral está ínsito na ofensa e, dessa forma, se
prova por si (“damnun in re ipsa”), sendo desnecessário exigir que
a vítima comprove a dor, o constrangimento ou a humilhação. É
suficiente apenas a prova do fato que enseja o pedido de
indenização (arts. 818 da CLT e 373, I, do CPC), e não a prova
dos danos imateriais, de resto, impossível.
No caso dos autos, em que pese não haver provas contundentes
no sentido de que o comentário sobre o “cabelo da Etiópia” se
referia à postulante ou que a dispensa da autora estaria
relacionada com os fatos narrados na exordial, no que pertine ao
comentário proferido pela supervisora Thais em reunião por
videoconferência, o fato é incontroverso.
A esse respeito, cabe ressaltar que o fato da ofensora e da própria
reclamada não enxergarem no comentário qualquer ofensa, não
é suficiente para que a ofensa, de fato, não tenha existido.
A triste realidade é que há inúmeras práticas racistas
naturalizadas em nosso cotidiano, materializadas em micro
agressões, que partem de comportamentos que, de tão
enraizados, são, por vezes, inconscientes – racismo estrutural.
A situação dos autos, portanto, tão corriqueira em nossa
sociedade, é apenas mais um exemplo do que se convencionou
chamar de “racismo recreativo”.
Tal termo foi cunhado pelo Professor Adilson Moreira, Doutor em
Direito Antidiscriminatório pela Universidade de Harvard que em
seu livro “O que é Racismo Recreativo?” discute, dentre outras
questões, o humor enquanto política de hostilidade às minorias
raciais.
Em entrevista concedida à Revista Carta Capital
(https://www.cartacapital.com.br/justica/adilson-moreira-oumorracista-e-um-tipo-de-discurso-de-odio/), o professor explicou
o que se entende por racismo recreativo:
“O racismo recreativo existe dentro de uma nação altamente
hierárquica e profundamente racista que formulou uma narrativa
cultural de cordialidade racial. Ele reproduz estigmas raciais que
legitimam uma estrutura social discriminatória, ao mesmo tempo
que encobre o papel essencial da raça na construção das
disparidades entre negros e brancos”
Já acerca das chamadas microagressões, assim discorre o
Doutor:
“O conceito de microagressões designa uma série de atos e falas
que expressam desprezo ou condescendência por membros de
grupos minoritários. Eles diferem de formas tradicionais de
discriminação baseadas na intenção aberta de ofender e
marginalizar porque podem ser conscientes ou
inconscientes, podem ocorrer sem violar normas jurídicas,
podem ser produto da ausência de visibilidade de grupos
minoritários. Uma mulher branca que atravessa a rua porque vê
um homem negro está praticando uma microagressão.
Microagressões podem tomar a forma até mesmo de atos que
aparentemente expressam polidez. Um segurança de shopping
que pergunta a homens negros se eles precisam de ajuda pode
estar na verdade motivado pela imagem da periculosidade do
homem negro. Uma piada sobre asiáticos pode parecer uma
forma de criar uma oportunidade de aproximação, mas ela
reproduz estereótipos que afetam a dignidade e a saúde
mental dessas pessoas.” (sem grifos no original).
A verdade é que todos nós precisamos estar atentos para não
incorrer nesse padrão comportamental tão enraizado e
naturalizado na sociedade, sendo que, no ambiente de trabalho,
cabe ao empregador essa fiscalização, caso contrário estará
sendo conivente com piadas que são verdadeiras manifestações
de injúria racial, como é o caso em apreço.
Observe-se que a forma como a ré se posiciona em sua defesa,
minimizando o desconforto e constrangimento da reclamante, já
demonstra a existência de uma “microagressão”, senão vejamos:
“A frase em si não carrega nenhuma ofensa, ainda mais proferida
de alguém que também é da cor negra e, cujo objetivo foi de
descontrair a tensão de todos por estarem fazendo uma reunião
online devido a situação de pandemia, reunião esta que
normalmente era presencial. Ainda, a frase em si, ou seja, tal
comentário seria a mesma coisa falar se “o Bruce Lee continuava
japonês”, fato notório e que todo mundo sabe. Não há qualquer
caráter discriminatório, ofensivo e principalmente vexatório”. (fls.
67). Desse trecho da contestação verifica-se que para a
reclamada uma piada que envolva questões raciais serve para
“descontrair a tensão”, o que representa um padrão
comportamental que precisa ser revisto e combatido. […] Causa
espanto ao Juízo que justamente em uma empresa de
comunicação, que se diz atenta e preocupada com a questão da
inclusão e da diversidade, um fato como esse tenha sido
banalizado e minimizado.
Dessa forma, nos termos do art. 932, III, do Código Civil, o
empregador responde pela reparação civil no caso de danos
causados por seus empregados e prepostos, no exercício do
trabalho que lhes competir, ou em razão dele, sobretudo porque
era seu dever propiciar aos empregados ambiente de trabalho
sadio e manter constante vigilância sobre seus subordinados, a
fim de prevenir situações como as discutidas nos presentes autos.
Ante todo o exposto, reconheço a presença de racismo recreativo
no comentário feito pela supervisora Thais à reclamante e arbitro
em R$20.000,00 (vinte mil reais) a indenização a título de danos
morais a ser paga pela reclamada, utilizando-se dos seguintes
parâmetros: a gravidade objetiva do dano; as condições pessoais
do ofensor; intensidade do dolo ou grau de culpa; gravidade dos
fatos e caráter pedagógico.
Os valores de danos morais arbitrados serão atualizados a partir
da prolação desta sentença. (Ação Trabalhista – Rito Sumaríssimo
1000228-60.2021.5.02.0027 Sentença – RENATA BONFIGLIO
Juíza do Trabalho Substituta – prolatada em 07 de maio de 2021
– Pje.
Dúvida não de que o fenômeno da tolerância social é um mal
globalizado para fins de escape usada pelos trabalhadores para suportar as condições
objetivas e cruéis impostas pelas organizações (MURAD, 2009; 150) citando GUEDES,
Márcia Novaes, concluindo que o fenômeno da tolerância social para com o mal é
mundial, do karoshi, que mata por overdose de trabalho no Japão, à birôla, que mata
os sertanejos do Brasil por excesso de trabalho nas Usinas de açúcar e álcool do Sul.
(op.cit), chegamos ao racismo recreativo, hoje não suportado no ambiente de trabalho,
como pudemos observar da bem lançada sentença da nobre Juíza do Trabalho
RENATA BONFIGLIO, ou seja, causa espanto ao Juízo que justamente em uma
empresa de comunicação, que se diz atenta e preocupada com a questão da inclusão
e da diversidade, um fato como esse tenha sido banalizado e minimizado.
De outro modo, a proteção do meio ambiente, por certo, não está
voltada para impedir a exploração econômica. Ambos são bens jurídicos a serem
observados pela legislação, mas um não pode aniquilar o outro e esse balanço não se
faz sem a devida legislação e a clareza da responsabilidade nos âmbitos
administrativos, civis e penais, além de observância rigorosa dos princípios da
prevenção, da proteção à dignidade humana, do direito à saúde e ao trabalho em
ambiente hígido.
EXEMPLO DE PROTEÇÃO EFETIVA AO MEIO AMBIENTE NO BRASIL E
EXPLORAÇÃO ECONÔMICA. CONVIVÊNCIA VIÁVEL.
Um destaque merecido para compreender a devida proteção
legislativa ao meio ambiente no Brasil, sem dúvida, está na ocorrência de Ações Civis
Públicas ajuizadas pelo Ministério Público na oportunidade da 12ª. Rodada de Licitação
da Agência Nacional de Petróleo – ANP, com a finalidade de exploração e produção de
recursos minerais não convencionais, na espécie, o Gás de Xisto ou o Gás de Folhelho,
com a possibilidade de utilização da técnica de Fraturamento Hidráulico (fracking).
Inicialmente, o nobre representante do Ministério Público
explanou tratar-se de exploração do Gás de Folhelho através da sistemática da
utilização da técnica de fracking, tida como nociva ao meio ambiente, tanto que foi
proibida em vários países, tamanho o dano que pode causar, principalmente, aos
aquíferos amplamente protegidos. Ab initio, obteve-se a concessão de liminares
judiciais para suspender o certame licitatório, exatamente por compreensão da
possibilidade de prejuízo, ou melhor dizendo, dano ou degradação ao meio ambiente
(aquíferos) em grande quantidade no Brasil. Quando das sentenças prolatadas nas
ACP´s ainda se vislumbrou o referido perigo de dano e definiu-se a nulidade do certame
e impedia-se a exploração da concessionária.
Importante destacar que se tratava de uma fase de estudos e
conclusões, em período estimado de 4 a 8 anos, para efetivar a possibilidade ou não
de produção do Gás de Xisto no Brasil, cabendo à segunda fase a real produção e, aí
sim, exploração econômica pela concessionária. Mas, foi possível observar o tamanho
da proteção e cuidado da legislação e da própria judicialização da matéria para com o
meio ambiente, quando se percebeu em segundo grau de jurisdição, através de recurso
de apelação, a ausência de perigo do dano ambiental com a primeira fase da licitação,
ou seja, a exploração conceituada no particular como o estudo da viabilidade da
produção e não a produção em si, motivo pelo qual os Tribunais Regionais Federais5
vieram a modificar sentenças de primeiro grau de jurisdição para julgar improcedentes
5 Tribunal Regional Federal da 5ª Região TRF-5 – APELAÇÃOCÍVEL : Ap 0800366-79.2016.4.05.8500;
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0006519-75.2014.4.03.6112/SP 2014.61.12.006519-8/SP RELATORA
Desembargadora Federal CECÍLIA MARCONDES – 3ª. Região TRF-3
os pedidos das Ações Civis Públicas do Ministério Público, permitindo que as
concessionárias prosseguissem no cumprimento do contrato de concessão e
terminassem a fase de exploração prevista no certame, repita-se, como intuito de
concluir pela viabilidade ou não em si da possibilidade no Brasil de exploração do Gás
de Xisto ou não, fase onde não era necessária a utilização da técnica de fraturamento
hidráulico.
A conclusão acaba por definir a extensão da proteção do meio
ambiente. Exatamente por contemplarmos na legislação o princípio da prevenção,
combinado com os princípios da responsabilidade civil de reparação do efetivo dano e
os princípios administrativos de fiscalização e prevenção do bem público e, além disso,
a existência da tipificação penal para atos ilícitos com degradação ao meio ambiente,
resultou na preocupação escorreita, no exemplo das Ações Civis Públicas acima
considerado, do Ministério Público na proteção dos aquíferos com a licitação para
exploração do Gás de Xisto, quando não, na visão dos julgadores a viabilidade da
exploração voltada para o estudo e pesquisa da viabilidade econômica, exatamente
propiciando ou não afastando da proteção ao meio ambiente, mas fazendo valer a
convivência de ambos os princípios protetores dos bens jurídicos (proteção ao meio
ambiente e exploração econômica) quando ficou certo e compreendido haver ausência
de dano ao primeiro6
.
6 IV – Cuida-se de demanda ajuizada para sustar os efeitos da 12ª Rodada de Licitações promovida pela ANP para a exploração
do gás de folhelho com ouso da técnica de fraturamento hidráulico, bem como os contratos firmados para a exploração de xisto
com a mesma técnica. Pede-se, ainda, que não sejam realizadas outras licitações no âmbito da ANP que envolvam fraturamento
hidráulico enquanto não houver estudos técnicos científicos que demonstrem a sua viabilidade de uso em solo brasileiro. Diz-se,
de forma bastante sucinta, que a técnica de fraturamento hidráulico é altamente questionada no mundo inteiro e representa
potencial risco de dano ambiental de extensão imensa e caráter irreversível, especialmente em relação aos cursos de água e
aquíferos que se localizam na região.
V – Num sistema petrolífero atuante as acumulações de óleo e gás natural ocorrem em rochas chamadas geradoras (folhelhos
[rochas sedimentar e sargilosas] ricos em matéria orgânica), que migram, depois, para a chamada rocha reservatório (rocha
sedimentar permoporosa) onde são contidas por rochas selantes e dão origem às jazidas de petróleo. A essa situação dá-se o nome
de recursos convencionais. Diferentemente, nos recursos não convencionais há confusão entre as funções das rochas geradoras,
reservatório e selante, de modo que há volumes consideráveis de óleo e gás natural nos
poros das rochas geradoras, as quais não possuem permeabilidade natural. A extração destes depende, em casos, do emprego da
técnica de fraturamento hidráulico, que consiste em fraturar finas camadas de folhelho com jatos de água e aditivos sob pressão.
VI – Não se tem nos autos informação se o fraturamento hidráulico consiste na única técnica para extração de recursos não
convencionais. Consta que se trata de procedimento já antigo, com primeiras utilizações datadas dos anos 40 e com relatos de
contaminação da água potável.
VII – Evidencia-se potencial econômico na exploração de recursos não convencionais, cujas estimativas em solo brasileiro indica
a existência de 7 trilhões de metros cúbicos de gás natural, o que coloca o Brasil no 10º lugar na lista das maiores reservas de gás
de folhelho.
VIII – A ordem econômica tem como um de seus princípios a defesa do meio ambiente (art. 170, VI, CF). Trata-se de notável
avanço, pois “o crescimento econômico e a até a simples sobrevivência da espécie humana não podem ser pensados sem o
saneamento do Planeta e sem a administração inteligente dos recursos naturais” (Édis Milaré, Direito do Ambiente, RT, 8ª
edição, pág. 225).
IX – O risco de dano ao ambiente, na espécie, não é desprezado. No entanto, a avaliação desses riscos depende de profundo
conhecimento geológico, sendo a angariação de conhecimento uma das finalidades da licitação. Ademais, consoante artigo 24 da
Lei nº 9.478/97, os contratos de concessão de exploração e produção de petróleo e gás natural são compostos de duas fases bem
definidas: na primeira, chamada de fase de exploração, tem-se por objetivo descobrir e avaliar jazidas de petróleo e/ou gás natural,
no qual o concessionário desenvolve atividades exploratórias de geologia e geofísica e, ao final, conclui pela viabilidade
econômica da exploração ou devolve a área para a União; na segunda, chamada fase de produção, as descobertas viáveis
comercialmente dão origem ao campo produtor, visando o abastecimento do mercado.
X – Os contratos de concessão para exploração e produção de petróleo e gás natural juntados nos anexos ao processo demonstram
minuciosamente as obrigações assumidas pelos concessionários durante as fases de exploração e de produção. Fica evidente, de
suas leituras, que as concessões para exploração e produção não investem, imediatamente, os concessionários no direito de
produção. Não asseguram automaticamente, da mesma forma, a viabilidade comercial da empreitada. Não garantem ao
concessionário o direito de uso da técnica de fraturamento hidráulico. E não descuram da proteção ambiental.
Vê-se, por conseguinte, tratar-se no caso concreto analisado nas
ACP´s de mera possibilidade de empresas concessionárias ligadas ao ramo do petróleo
e gás, realizarem pesquisas, análises e testes nos locais definidos pela ANP com a
finalidade de definir existir realmente o Gás de Xisto nas respectivas áreas estudadas
e se seria possível o Brasil produzir sem o comprometimento do meio ambiente.
CONCLUSÃO.
Conclui-se, pois, com facilidade, a extensão da proteção do nosso
meio ambiente, proteção que cede para a própria exploração econômica, outro bem
necessário de observação do nosso ordenamento jurídico, somente através da
demonstração do não prejuízo do meio ambiente, tornando possível a existência do
segundo sem ser em detrimento do primeiro, pois respeitados os princípios da
prevenção e observados os princípios da responsabilidade por impactos e danos por
ventura causados ou de perigo ao meio ambiente, sendo eficaz a própria reparação
através da educação ambiental ou compensação ambiental, quando impossível a
reparação de outra forma.
Enfim, apesar de constatarmos uma distância evidente da bem
elaborada legislação brasileira e a eficácia de sua aplicação, sempre se chegará à
proteção efetiva do meio ambiente e não faltará instrumentos para a qualquer momento
da proteção, seja para impedir o dano, para proteger do dano ou restaurar um dano,
ainda que irrestaurável o dano, meios há para compensar ou educar para evitar novos
danos ou compensar de maneira a propiciar o afastamento da degradação de modo
mais completo possível. Trata-se mesmo de proteção ampla e irrestrita, que cede
apenas diante da total viabilidade de controle e até de restauração de possível dano
que vier a ocorrer, mesmo quando impossível recompor a meio ambiente pela atividade
danificadora ou depender de indenização por danos imateriais determinadas pela
Justiça do Trabalho.
XI – A atividade de mineração em si configura risco de dano ambiental. Mas estes riscos devem ser analisados pelo órgão
ambiental competente por ocasião do licenciamento ambiental (art. 3º, VI, do Decreto nº 8.437/2015). Assim, por ocasião da fase
de produção, quando houver risco de degradação ambiental, poderá vir a ser exigido o EIA/RIMA que precede a licença.
XII – O princípio da precaução do direito ambiental tem por primazia a proteção do meio ambiente quando a informação científica
for insuficiente, inconclusiva ou incerta a respeito dos possíveis efeitos nocivos da atividade. Na espécie, há de ser afastado
porque não há certeza a respeito do efetivo emprego da técnica de fraturamento hidráulico; de outro lado, há elementos que
permitem afirmar que as falhas técnicas observadas no passado foram objeto de estudos e aprimoradas, sendo atualmente utilizada
em países desenvolvidos como Estados Unidos, Holanda, Inglaterra e China.
XIII – “A atividade de mineração possui interface direta com a realidade do meio ambiente, dado que não há como extrair um
mineral sem danos. Constitui tal atividade, sem dúvida, uma agressão sumária à natureza adormecida, representando um dos
ramos industriais mais perversos do ponto de vista ambiental. Como não podemos, contudo, descarta-la, pura e simplesmente,
impõe-se diminuir os estragos que causa, com a adoção de tecnologias de aproveitamento adequadas, capital e vontade.” (Édis
Milaré, Direito do Ambiente, RT, 8ª edição, pág. 196). Os recursos minerais, incluindo os não convencionais, são bens da União
(artigo 20, IX, CF) e a exploração destes para fins econômicos constitui faculdade do ente federal, não competindo ao Poder
Judiciário impedi-la, vedá-la ou embaraçá-la, sob pena de invasão à sua autonomia e de violação ao princípio da separação dos
poderes (art. 2º,CF).
XIV – Sucumbência invertida, sendo descabido pagamento de honorários advocatícios (artigo 18 da Lei nº 7.347/85).
XV – Agravo retido de fls. 1582/1597 não conhecido e improvido o de fls. 1627/1631; negado provimento à apelação de Petra
Energia e Bayar Empreendimentos e Participações Ltda.; prejudicada em parte a apelação da Petrobrás e, no que sobeja, negado
provimento; provida a apelação da ANP ea remessa oficial para julgar improcedente o pedido.” APELAÇÃO/REMESSA
NECESSÁRIA Nº 0006519-75.2014.4.03.6112/SP
REFERÊNCIAS
MAGRI, Cinthia H. K.; BENTO, Luciana R. Nogueira – Infraestrutura no direito do
ambiente – A Responsabilidade Ambiental (Administrativa, Civil e Penal) por acidentes
marítimos – pág. 816/848.
SAMPAIO, J.P. Lorenzi; GRANZIERA, M. L. Machado – Petróleo, Gás e Meio Ambiente
– Cáp. 1 – O Conceito de dano ambiental no direito brasileiro – pág. 15/36.
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0006519-75.2014.4.03.6112/SP
APELAÇÃOCÍVEL Ap0800366-79.2016.4.05.8500.
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0006519-75.2014.4.03.6112/SP
2014.61.12.006519-8/SP.
Ação Trabalhista – Rito Sumaríssimo 1000228-60.2021.5.02.0027 Sentença – RENATA
BONFIGLIO Juíza do Trabalho Substituta – prolatada em 07 de maio de 2021 – Pje.
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MURAD, Samir Jorge – Meio Ambiente do Trabalho no contexto das Cidades
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MELO, Raimundo Simão de – Direito ambiental do trabalho e a saúde do trabalhador –
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FIORILLO, Celso Antonio Pacheco e FERREIRA, Renata Marques – Tutela jurídica das
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